A Vida e Morte de Henrique, Duque da Cornualha, Filho de Henrique VIII

O ano era 1510 e Catarina de Aragão, Rainha da Inglaterra, estava grávida. À medida que os meses passavam, sua gravidez progredia e era quase hora de ela retirar-se para a câmara de nascimento a fim de repousar, conforme exigia o costume. Em novembro, realizou-se um grande torneio, onde seu marido, o monarca Henrique VIII, superou a todos os outros participantes. A Corte então lentamente fez seu trajeto para o Palácio de Richmond. Antes de deixar a sociedade, uma série de entretenimentos foram encenados para ela por Henrique. Ele estava determinado a impressionar Catarina e alguns representantes das Cortes de seu pai, Fernando de Aragão, e de seu sobrinho, Carlos V, o Sacro Imperador Romano.

Em uma dessas apresentações, Henrique e quinze senhores cavalgaram na frente de Catarina e da platéia, em trajes fantásticos. Usavam gibões de púrpura e carmesim com gorros de veludo branco drapeados em damasco dourado, cobertos por plumas brancas. Após a dança eles saíram e os músicos entraram com seis cavalheiros vestindo cetim amarelo e carregando tochas. Em seguida, mais seis homens chegaram mascarados e vestidos com roupas extravagantes e gorros de tecido de prata. Todos tentaram fingir que não sabiam quem era o cavalheiro mais alto. As damas chegaram vestidas de cetim carmesim bordado com romãs feitas de pano de ouro e dançaram com os senhores. Quando a dança terminou, as senhoras removeram as máscaras dos homens para que pudessem ser identificadas. Todos os presentes, para o deleite do rei, o elogiaram.

Pouco antes do Natal, Catarina assistiu a missa e, em seguida, organizou um banquete para os homens e mulheres da Corte em sua grande câmara. Vinho e especiarias foram servidos e então dois senhores de alto escalão acompanharam a rainha até a porta de seus aposentos. Ela despediu-se de seus oficiais e cortesãos. Catarina então entrou nos cômodos e não seria vista novamente até que seu filho tivesse nascido.

Nenhum homem, nem mesmo o rei, foi permitido entrar na câmara a partir daquele momento. Todos os itens necessários foram entregues fora da porta e levados para dentro pelas damas. O quarto não tinha luminosidade natural, uma vez que tapeçarias foram penduradas por toda a parede, retratando imagens de romance. Acreditavam que o ar era impuro e carregava doenças, portanto, era necessário que o local estivesse selado. Não havia representações de imagens sombrias ou assustadoras, que pudessem amedrontar a mãe ou a criança. A pia batismal de Canterbury foi colocada na câmara, no caso de que a criança estivesse em apuros e precisasse ser batizada às pressas.

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Para a alegria geral, foi um saudável menino que nasceu no dia de Ano Novo, em 1511. Henrique ficou muito aliviado e ordenou que fogueiras fossem acesas nas ruas de Londres, instruindo o Lord Prefeito a organizar para que os cidadãos fossem servidos com vinho em tonéis, a fim de beber pela saúde do jovem Príncipe. O canhão ao longo da Torre Wharf disparou uma saudação real. A parteira foi para casa com uma grande recompensa em dinheiro.

Catarina assistiu enquanto suas damas lavavam e enrolavam a criança e a colocavam em seu luxuoso berço. Ele possuía 1,52 de altura, por 60 centímetros, feito em madeira e pintado com prata dourada e fivelas em cada lado para segurar as faixas do swaddling (falamos sobre a técnica do swaddling: aqui). Quando Catarina já estava bem o suficiente para sentar-se, sua cama foi levada para a câmara de presença onde, vestida com um manto carmesim, ela recebeu os convidados. O costume exigia que a nova mãe permanecesse na câmara, deitada durante trinta a quarenta dias. Ela então iria participar de uma cerimônia chamada ‘churching’, onde seria purificada, podendo então retornar às suas atividades normais.

Cinco dias após seu nascimento, o príncipe foi levado por sua enfermeira para a Igreja dos Observant Friars ao lado do Palácio de Richmond. O batismo foi testemunhado por grandes cortesãos e os embaixadores da França, Espanha, Veneza e do Papa. A criança foi chamada Henrique, assim como seu pai e avô, e tornou-se Duque da Cornualha. Ele contava com padrinhos renomados: O Arcebispo de Canterbury William Warham, O Conde de Surrey, e sua tia-avó e tio, Condessa e Conde de Devon. Seus outros padrinhos foram o Rei Luís XII da França e Margarida da Áustria, a Duquesa de Sabóia, filha do Sacro Imperador Romano, Maximiliano I. Luís e Margaret enviaram caras baixelas de ouro como presente.

Após o batismo, os embaixadores visitaram Catarina em sua câmara privada a fim de felicitá-la. Uma vez que a rainha havia sido purificada na cerimônia de churching, ela e Henrique foram ao Palácio de Westminster, deixando o jovem príncipe em seu berçário em Richmond. Seus pais o teriam visitado, mas cada detalhe de seus cuidados diários era cuidado por uma dama, que supervisionava a ama de leite, a enfermeira e outros funcionários.

Henrique aproveitou-se da oportunidade do nascimento do príncipe para comemorar apresentando luxuosos entretenimentos em sua honra. No dia 1 de Fevereiro, ele reuniu três de seus companheiros, todos vestidos com casacos de cetim verde aparados em veludo carmesim. Ele lançou um desafio para qualquer um tentar sua sorte contra ele e uniu-se com seus homens contra quatro outros cortesãos.

No dia 12 de fevereiro, talvez o maior e mais fabuloso torneio do reinado de Henrique foi realizado. Catarina e suas damas de estado sentaram-se dentro de um recinto forrado com pano de ouro e veludo roxo, todos bordados com H e K, romãs e rosas. Enquanto observava, apareceu no grande pátio uma enorme carroça de desfile parecendo uma floresta mágica, com flores, ervas e árvores. No centro havia um enorme castelo dourado. Ela foi puxada por dois ”animais”; um leão coberto em tecido de damasco e ouro, e um antílope com os chifres dourados, coberto de damasco prateado. Enquanto todos olhavam para o desfile com admiração, os lados da carroça caíram repentinamente. As trombetas soaram enquanto Henrique e seus homens cavalgavam em cavalos de batalha cobertos de ouro.

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Henrique VIII participando de uma Justa diante de sua rainha, Catarina de Aragão. Imagem do Great Tournament Roll of Westminster, datado de 1511.

O desfile foi dominado por Justas com o rei e seus homens cavalgando sobre arrolamentos de pano de ouro e veludo roxo com as letras ‘H’ e ‘K’ bordadas em dourado. O dossel de Henrique era coberto por uma coroa imperial dourada. Eles seguram curso e Catarina concedeu prêmios aos vencedores. Henrique recebeu o prêmio de seu desafiador em grande aplauso. Na noite seguinte, houve grande folia em Whitehall com mais torneios, danças e roupas ornamentadas. Isto foi seguido por um banquete na câmara de presença atendida por toda a Corte.

Dias mais tarde, uma terrível notícia chegou aos novos pais. O príncipe Henrique havia falecido apenas cinquenta e dois dias após seu nascimento. Não há consenso sobre a causa da morte. Ele pode ter adoecido, como ocorria e ocorre com muitos bebês. Ou possivelmente, ele morreu de síndrome de morte súbita infantil. Seja qual for a causa, foi uma terrível tragédia para a dinastia do rei. Catarina estava perturbada e Henrique fez o melhor que pôde para confortá-la. O último rito a ser concluído, seria o enterro da própria criança com todas as honras devidas por um príncipe.

A etiqueta determinava que o rei e a rainha não comparecessem ao funeral em pessoa, confiando a execução da cerimônia a cortesãos. Arranjos foram feitos para enterrar o Príncipe na Abadia de Westminster. O pequenino caixão foi levado do Palácio de Richmond até o Tâmisa, onde três barcaças cobertas de preto o levaram pelo rio. Todos os envolvidos na cerimônia trajavam negro. Nela incluíam os lamentadores oficiais, os que levaram o caixão, seis cavaleiros que portavam bandeiras religiosas e régias, vários servos e 180 pessoas pobres que eram pagas para orar pela alma da criança.

Velas foram acesas ao longo do trajeto e orações foram entoadas enquanto a comitiva seguia seu caminho rumo à Abadia. Os monges presentes no local receberam os restos do menino. O coro estava coberto de preto e com toda a solenidade, o caixão foi abaixado até sua sepultura. O príncipe foi enterrado na ala norte do santuário, perto da entrada da Capela do fundador da Abadia, Santo Eduardo, o Confessor.

Embora Catarina e Henrique estivessem devastados pela morte de seu filho, eles ainda eram jovens e capazes de ter outras crianças. Porém, como todos sabemos, Catarina teve muitas gestações, mas apenas uma filha sobreviveu à infância, a Rainha Maria I. Sua ‘falha’ (grifo meu) em gerar um herdeiro levaria ao ”Grande Dilema do Rei”, a tentativa de Henrique em anular seu casamento com Catarina de Aragão, a fim de desposar Ana Bolena. Ironicamente, Ana só foi capaz de dar à luz uma outra filha, a futura rainha Elizabeth I. Henrique não teria outro herdeiro varão sobrevivente, até que Jane Seymour, sua terceira esposa, desse à luz o futuro Eduardo VI.

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Imagem meramente ilustrativa de um bebê do século XVI.

FONTES:

The Freelance History Writer: AQUI. 

 

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