Elizabeth, ”a Sanguinária”

Não, não erramos o título. O artigo de hoje tem como intenção trabalhar com estereótipos, a fim de mostrar os dois lados de uma mesma moeda. Enquanto Elizabeth I da Inglaterra, foi conhecida por muitos como a ”boa rainha Bess” ou ”Gloriana”, é importante destacar que ela não era vista desta modo por todos, especialmente católicos e irlandeses.

Todo monarca absolutista, tinha sangue em suas mãos e Elizabeth, como Rainha absolutista, não teve o privilégio de ser diferente, sendo tão ‘sanguinária’ quanto o resto de sua família e ‘colegas de ofício’. É claro que utilizamos este título, a fim de chocar os leitores; embora seja verdade, que esta tenha sido uma das alcunhas que a última rainha Tudor possuiu – no entanto, é interessante notar, que ela nos é ocultada atualmente. Graças à propaganda protestante, Elizabeth – que perseguiu católicos – foi relegada ao estigma de mãe de seu povo, enquanto sua irmã católica, Maria I, ficou marcada pela alcunha de Bloody Mary durante séculos – inclusive atualmente – por perseguir protestantes durante seu reinado.

Se agora estiver passando em sua cabeça, o seguinte questionamento: “Mas ela fez coisas boas, por isto não se lembram do aspecto negativo”; peço que leiam o artigo Historia Parcialidade Tudors e Sangue, onde falamos sobre a funcionalidade da História e como alguns utilizam-se dela.

No entanto, estamos cientes que tratando-se da popularidade de Elizabeth, será uma tarefa complicada abordar este outro lado de sua figura, que é tão querida no consciente coletivo. A pesquisadora Julia Walker, havia tentado trabalhar este aspecto de Elizabeth, consequentemente sofrendo com a falta de interesse em seu tema; eu mesma, ao pesquisar sobre o assunto, senti bastante dificuldade em encontrar bons materiais sobre as perseguições de Elizabeth, e quando estudamos política, compreendemos perfeitamente bem porque isto ocorre.

ELIZABETH E A PERSEGUIÇÃO AOS CATÓLICOS E PURITANOS:

Com a ascensão de Elizabeth ao trono inglês, após a morte de sua irmã católica Maria I, a crença de muitos protestantes que refugiaram-se em países da mesma fé, era de que, com Elizabeth tornando-se rainha, o protestantismo teria vez na Inglaterra e o catolicismo seria banido do reino. Porém, inicialmente Elizabeth não deixou transparecer qual seria o viés religioso de seu governo. Do mesmo modo que Maria era católica assumida, mas no início de seu reinado, respeitou a liberdade de culto, Elizabeth era protestante, porém, não deixou claro o caminho religioso que abordaria, mostrando uma liberdade de culto aos católicos, desde que estes, prestassem lealdade à coroa. Entretanto, os bispos foram instruídos pelo governo, a retirar de igrejas e capelas, qualquer objeto utilizado pelo catolicismo. Em outras palavras, caso você fosse leal à Rainha protestante, poderia praticar o catolicismo dentro de sua residência, mas não iria encontrar capelas ou igrejas com ornamentos católicos. Uma atitude, já um tanto dúbia.

Um dos erros comuns da Historiografia, é acreditar que o catolicismo morreu com Maria I, quando este, de fato continuaria forte até mesmo após a morte de Elizabeth. Existiram relatos de bispos ao governo elizabetano, marcando importantes pontos do reino, onde o catolicismo ainda era forte, como Arundel, Lindfield e Battle.
Como resultado de toda esta confusão, podemos afirmar que no inicio do reinado de Elizabeth I: “Existia tolerância em uma via (desde que existisse lealdade) entre as áreas influentes, mas não havia tolerância nos serviços da igreja”.

Tal qual Maria I, foi uma revolta que fez com que a política religiosa de Elizabeth mudasse: Se a intolerância religiosa com católicos estava limitada aos serviços religiosos, à partir da Revolta dos Condes, em 1569 e da bula papal, que dava autoridade à qualquer católico de retirar Elizabeth do posto de rainha da Inglaterra, a intolerância iria então, passaria a espalhar-se de modo avassalador e violento.

É claro que não iremos prestar o desserviço histórico que já é feito com Maria faz séculos e transformar Elizabeth em mera perseguidora, porém, mostraremos este seu lado conscientemente ocultado. Novamente, a intenção não é recriminá-la (como fazem com Maria I) por tais perseguições, afinal existiu um contexto histórico e político bastante complexo. Porém, faz-se necessário observar que os atos cometidos pelo governo elizabetano, eram em grande parte, totalmente infundados. De acordo com a revista inglesa “History” da BBC (de junho do ano passado), Elizabeth e seu conselho, muitas vezes viam traições onde não existiam, agindo com enorme violência. Vejam alguns casos:

O caso de John Storey: John havia deixado à Inglaterra, renunciando à sua lealdade para com o reino (algo próximo de renunciar sua cidadania), indo começar uma nova vida, aos serviços do Rei Filipe II da Espanha – sem nenhuma indicação que estivesse conspirando contra Elizabeth I.
Então, os agentes da Rainha, violando a soberania de outro governante, entraram na Holanda espanhola, sequestraram-no, prenderam-no e o trouxeram de volta à Inglaterra, a fim de torturá-lo e tentar executá-lo.

Puritanos: Não eram apenas os católicos os alvos de Elizabeth; os puritanos também foram grandes alvos da Rainha.
Os puritanos, protestantes influenciados pelos escritos de Calvino, viam a igreja anglicana, como muito semelhante à de Roma, e lutavam por maior espaço político, além de se manifestarem frente a estas semelhanças. Por este motivo, Elizabeth os via como uma ameaça ao poder real.

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Elizabeth e a Guerra na Irlanda:

O primeiro monarca Tudor a tornar-se Rei da Irlanda, foi Henrique VIII, assim proclamado, durante seu matrimônio com a mulher que seria sua sexta e última esposa, Catarina Parr. Após Henrique, naturalmente seus três filhos o sucederam. No caso de Elizabeth, sua última herdeira e última monarca Tudor, existiram algumas complicações.

De acordo com o pesquisador O’Neil, a responsabilidade da guerra dos nove anos, envolvendo a resistência irlandesa contra o governo de Elizabeth, recai acima de tudo, sobre a própria rainha e sua política de descaso com a Irlanda e “reatividade” em não buscar acordos ou entender o que passava-se na ilha, apenas reagindo – e com muita violência – aos acontecimentos que envolviam Irlanda e Inglaterra.

Graham Land, afirma que a violência do governo de Elizabeth contra os irlandeses era enorme, utilizando de táticas militares, como a “Terra arrasada”, que consistia em queimar tudo o que vissem pela frente:

“Em 1569, no inicio do reinado de Elizabeth I, uma força de 500 ingleses arrasaram vilarejos irlandeses, queimando tudo o que vissem pela frente, matando homens, mulheres e crianças. Uma linha de cabeças era colocada no chão por noite, que levassem ao comandante Humphrey Gilbert.”   

O punho de ferro da Rainha foi tão forte, que de acordo com Land, nem os soldados espanhóis rendidos, crianças ou mulheres grávidas, foram poupados do massacre na Irlanda:

“E de fato continuou, 400 mulheres e crianças massacradas pelo Conde de Essex; 5 anos depois, em 1580, Elizabeth elogiou Lord Grey e seu capitão, o futuro favorito da rainha, Sir Walter Raleigh, por executar 600 soldados espanhóis que estavam já entregues na Irlanda. Também torturaram e enforcaram mulheres grávidas”.

  • Agora devemos chamar atenção para alguns pontos:
  1. O histórico de execuções de mulheres grávidas, sempre permeou a vida das irmãs Maria I e Elizabeth I; a primeira, acusada de enviar à fogueira, uma mulher grávida de 9 meses, e a segunda, acusada de ordenar a execução sumária de diversos irlandeses e soldados espanhóis, independente se fossem homens, mulheres grávidas ou crianças pequenas. Porém, apenas lembramos de uma que fora execrada por tal ato, e esta é Maria; raramente ouvimos ou lemos sobre os atos de Elizabeth, muito pelo contrário e é para isto que este artigo foi feito.
  2. Executar mulheres grávidas, era contrário a legislação inglesa do século XVI, e visto como algo bastante problemático no período; logo -creio eu-, tanto Elizabeth e Maria (ou seus respectivos conselhos), se soubessem de fato que mulheres grávidas estavam sendo executadas, poderiam manifestar-se contrariamente à tais execuções. Entretanto, nem as perseguições à católicos e puritanos no reinado de Elizabeth e tampouco as perseguições de Maria I à protestantes, eram lideradas pelas mesmas, mas sim, por líderes locais que detinham tal autoridade.
  3. Certamente alguém pensou: “Mas era uma guerra”; enfim, é bastante problemático acreditar que atos bárbaros (muitas vezes vistos naquele período como tal), são justificáveis por uma guerra, ou que a figura de Elizabeth, merece “perdão” pelo massacre irlandês. Se pensam deste modo, então podemos apenas realizar duas observações:
    1- Façam vista grossa também, a outros líderes, reis ou rainhas, que impunham violência e sangue (naquele período ou atualmente), ou aceitem que aquele rei, rainha ou líder, com uma enorme propaganda política à sua volta, também era passível de sanguinolência.2- Considerem então, que Maria I não deve ser reconhecida como “não” sanguinária, mas sim, todos de sua família e época, devem então, carregar tal alcunha.
  4. Atualmente e desde o reinado de Elizabeth I, para os Irlandeses, a última soberana Tudor, é quem foi a verdadeira rainha sanguinária.FONTES:
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    O’ NEILL, Eoin. A inglória ilha de Gloriana: Elizabeth I, responsabilidade e honra na guerra dos nove anos na Irlanda.LAND, Graham. Eram os Tudors Terroristas Bárbaros?The History Learning site. Elizabeth I and the Catholic Church

    History BBC Junho 2014. A perseguição de Elizabeth I aos Católicos e o santo John Storey.

    Elizabethan-era: AQUI.

2 comentários Adicione o seu

  1. Dianah B disse:

    Excelente artigo! Realmente depois que me aprofundei na vida de Mary Tudor percebi como a História tem um pouco de “telefone sem fio” aumentando um ponto – para o bem ou para o mal – sobre alguma personalidade ou fato histórico.

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